Na nossa casa tinha um pé de boldo no quintal, bem perto do muro da calçada. Na verdade era uma árvore, pequena mais era.

Meus pais falavam que aquele era boldo do chile, o mais amargo de todos! rsrsrsrs

Era comum a gente ouvir de dentro de casa um arrancar de folhas, olhávamos da janela e falávamos: ah! é uma pessoa pegando folhas do boldo. 

Certamente alguém precisando do chá para curar algum mal, geralmente do estômago ou do fígado.

Lá em casa a gente sabia bem do amargor que aquelas folhas tinham, e quando víamos o chá sendo preparado sempre vinha um espantado "quem vai tomar chá de boldo??" Seguido com certeza de um pensamento de alívio de "ainda bem que não sou eu".

Me lembro de algumas vezes (poucas, graças!) chegar para minha mãe e falar: mãe, tô sentindo a minha boca com um gosto de gordura... e claro, um leve mal estar junto.

- Ih, deve ser o seu fígado. Toma chá de boldo que passa. 

- Ah, não vou tomar, muito ruim esse chá.

- Ué, você que sabe. Quem tá sentindo é você.

Esse era o esquema lá de casa, rsrsrsrsrs. Sem firulas. 

Daí eu continua com aquele mal estar, vendo todo mundo na rua brincando e eu lá borocoxô...

Quer saber? Eu pensava, vou logo tomar esse chá.

E aí era a minha vez de ouvir minhas irmãs passando e falando com tom de dó: aí, você vai tomar chá de boldo? 

Daí eu respirava fundo e ouvia minha mãe falando: vai, toma de gut-gut, que vai rapidinho. Gut-gut significava tomar de uma vez só, sem fazer pausas que significava prolongar o sofrimento. Pois depois de ter sentido o gosto seria mais difícil levar o copo a boca de novo.

E assim eu fazia. E haja caretas e sacolejos de arrepios no final. rsrsrsrsrs

Mas quer saber? Como dizem: era como tirar com a mão.

Logo eu tava toda serelepe correndo na rua sem vestígios do que estava me incomodando.

Então entendi que o remédio amargo geralmente é o que nos salva e que a escolha é nossa. Podemos relutar a tomar e assim ficar mais tempo com a dor, podemos ficar tentando outros remédios mais "doces" e levar mais tempo para o mal passar e perder aí um tempo precioso de brincadeiras na rua ou encarar, mandar com coragem o bicho pra dentro e ir correndo feliz pra galera. 

E aqui eu já tô falando da vida.